Cena de A Maldição de Cinderela (Reprodução)

Créditos da imagem: Cena de A Maldição de Cinderela (Reprodução)

Filmes

Crítica

A Maldição de Cinderela é raro terror classe-Z cuja única limitação é orçamento

Trash da diretora Louisa Warren sofre por não conseguir realizar seu gosto pelo barroco

Omelete
3 min de leitura
20.06.2024, às 10H20.
Atualizada em 20.06.2024, ÀS 12H09

Seria ingênuo dizer que o único problema de produções como Ursinho Pooh: Sangue e Mel e O Malvado: Horror no Natal, entre tantas outras da safra mais recente do terror independente, é o orçamento. Embora sejam, sim, produzidos por um dinheiro que a internet caracterizaria como “duas coxinhas e um sonho”, esses filmes frequentemente patinam em uma incompetência técnica, narrativa e tonal que denuncia o pouco caso irritante com que parecem tratar a sensibilidade do público - mesmo aquele que só está procurando uma sessão de cinema razoavelmente divertida.

Pois bem: A Maldição de Cinderela vai diretamente na contramão dessa tendência. Ambicioso, o longa parece estar em constante negociação com sua vontade óbvia de se aproximar de um horror barroco, de composições grotescas e sangrentas apresentadas em chave tonal grave. É um simulacro de terror operático à la grand guignol que se prova muito difícil de sustentar sem os recursos de uma produção de Guillermo Del Toro ou de Luca Guadagnino… mas a diretora Louisa Warren (que recentemente fez uma ponta em Ursinho Pooh: Sangue e Mel 2, como uma das vítimas do Tigrão) insiste em tentar, às vezes até valorosamente. 

Há dois ou três momentos de competência pontual chocante em A Maldição de Cinderela - uma composição bem requintada de gore à mesa de jantar aqui, uma concepção de personagem genuinamente arrepiante acolá -, e há também a sustentação de um tom sinistro por quase toda a produção, o que deixa à mostra que Warren entende muito bem como se movimentar pelo território do gênero. Talvez tenha a ver com o fato de que ela assinou sete (sim, sete!) filmes de terror só em 2023, acumulando mais de 30 créditos em seu nome desde o começo da carreira. Na melhor tradição dos grandes operários do terror de baixo orçamento (pense William Castle, Roger Corman, José Mojica Marins), ela prova que não há nada melhor para se tornar fluente em uma língua do que praticá-la incansavelmente.

Ainda assim, há entraves inescapáveis com os quais A Maldição de Cinderela se depara na hora de escolher como usar os míseros dólares que tem à mão. Warren prefere, por exemplo, investir mais nas sequências que estabelecem a sua perversão do famoso conto de fadas no qual se inspira a trama do que na catarse da vingança violenta que sua protagonista perpetua contra os vilões no terceiro ato. As cenas de morte não conseguem fugir de uma decepção anticlimática, portanto, especialmente diante do surpreendente candor que o filme emprega ao estruturar-se como uma história de conflito de classes em que a violência dos privilegiados contra os oprimidos é real e direta, esmagando qualquer indício do idealismo dos conto de fadas.

Além de deixar esse arco de revanche inacabado, ao menos do ponto de vista sensorial, A Maldição de Cinderela também abandona subtramas que ficam sem resolução, resvala no humor não-intencional durante algumas cenas de massacre claramente criadas só para aumentar a contagem de corpos do filme, e desliza em seu discurso pop sobre a ambiguidade moral dos relacionamentos e posicionamentos sociais femininos. A verdade é que Warren e seu montador Jack James estão trabalhando duro, aqui, para retorcer o roteiro de Harry Boxley em um formato que caiba simultaneamente na embalagem de filme de terror classe-Z para as massas (que aperta pelo menos 15 assassinatos em um espaço de menos de 1h30) e nas aspirações de gênero mais bem informadas que eles claramente alimentam.

Previsivelmente, esse ato de contorcionismo não funciona muito bem - mas ainda é extraordinariamente refrescante saber que ainda tem gente à solta por aí, fazendo a coisa mais fora de moda possível nesses tempos cínicos: tentando.

Nota do Crítico
Regular
A Maldição de Cinderela
Cinderella's Curse
A Maldição de Cinderela
Cinderella's Curse

Ano: 2024

País: Reino Unido

Direção: Louisa Warren

Roteiro: Harry Boxley

Elenco: Danielle Scott, Lauren Budd, Chrissie Wunna, Kelly Rian Sanson, Sam Barrett

Onde assistir:
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