Carol Duarte: Conheça a atriz brasileira mais empolgante do momento

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Entrevista

Carol Duarte: Conheça a atriz brasileira mais empolgante do momento

Com La Chimera, agora em cartaz, protagonista de A Vida Invisível entra no cenário internacional

Omelete
10 min de leitura
03.05.2024, às 19H08.

Na última semana de abril, entrou em cartaz no Brasil um grande filme, assinado por um dos nomes mais significativos do cinema italiano recente, com Josh O’Connor no elenco, e uma atuação brilhante de uma jovem atriz em seu coração. Sim, tudo isso se aplica a Rivais, de Luca Guadagnino, mas aqui, estou falando do hipnotizante e apaixonante La Chimera, de Alice Rohrwacher, e a estrela em seu centro é a empolgante, brasileira e excelente Carol Duarte.

Duarte, natural de São Paulo e presença constante no teatro, não é exatamente uma novata no cinema. Há cinco anos, ela protagonizou A Vida Invisível de Karim Aïnouz, longa que foi premiado no Festival de Cannes e lhe rendeu prêmios e reconhecimento. Nos últimos 12 meses, porém, sua carreira na telona parece estar subindo de nível, e com razão. Atuando com vulnerabilidade e leveza, ela quase roubou o italiano La Chimera, que estreou em Cannes em 2023 e está agora em cartaz no Brasil. Em paralelo, ela contracenou com uma tempestuosa Yara de Novaes em Malu, filme semi autobiográfico de Pedro Freire que conquistou audiências internacionais no Festival de Sundance deste ano, o principal evento do cinema independente internacional.

Por isso, eu estava ansioso para conversar com ela nessa entrevista. Não é um exagero dizer que Carol é a mais empolgante atriz brasileira do momento; uma presença que nos conquista quase instantaneamente quando entra em tela. Seja no surrealismo que permeia La Chimera ou na explosividade crua de Malu, ela não só encara o material, como parece melhorar toda cena através daquilo que eu descreveria como sua melhor qualidade: naturalidade. Em sua mão, a performance desaparece e somos deixados com a personagem.

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Falando com ela, fica claro não que esse bom trabalho de atuação vem de um cuidado muito grande em entender não só seu papel, mas o estilo de cada diretor com quem trabalha. Falar com Carol nos faz conhecer mais sobre suas personagens, ler os filmes onde ela atua de maneira mais profunda e até abrir os olhos para coisas que não enxergamos. Para ter essa experiência, leia abaixo nossa conversa:

Guilherme Jacobs: Estou feliz por poder falar contigo agora. Quase pude te entrevistar em Cannes ano passado mas acabou não rolando. Revi La Chimera, e continuo bancando que você é a melhor parte do filme. Eu queria perguntar para você, como é que você chegou nesse filme? Você não está começando este ano sua carreira de atriz, mas já está num aclamado filme internacional, que foi para Cannes. Eu queria entender como é que você chegou nesse filme.

Carol Duarte: Obrigada, fico muito feliz assim. Acho que o dia lá de Cannes foi muito especial, desde o lançamento do filme foi muito bem recebido, então foi super emocionante. E como é que eu cheguei no filme? Bom, a diretora de fotografia da Alice, que é o que faz todos os filmes dela, Hélène Louvart, é a mesma diretora de fotografia do Vida Invisível, que é o meu primeiro filme, o filme do Karim que ganhou no Festival de Cannes o prêmio da mostra paralela Um Certo Olhar.

A Alice estava buscando uma atriz para fazer essa personagem chamada Itália. Eu recebi uma mensagem da abertura do elenco, perguntando se eu toparia conversar com ela numa chamada de vídeo. Eu topei, e nessa conversa ela me perguntou se eu falava um pouco de italiano, eu disse que falava, e topei fazer um teste no dia seguinte mesmo. Foi super rápido. Em 10 dias eu tava na Itália para gravar.

Como você mencionou, você fala italiano em boa parte do filme. Mas você também fala em português, e fica claro que a Itália é brasileira. Isso foi algo que você construiu junto com a Alice?

Acho que essa é uma pergunta que Alice pode responder melhor, mas até onde eu sei é essa personagem não era brasileira. Ela testou várias atrizes que não eram brasileiras e quando ela me escolheu, então ela escolheu os atores pros filhos. Ela escalou a Júlia para a filha mais velha, ela é ítalo-brasileira, mora lá, mas a família toda fala português. Então ela foi definindo a Itália a partir da escolha, a partir do momento que eu fui escalada, e acho que também tem um interesse nela nessa mistura, né?

A Lou [Roy-LeCollinet], que faz a personagem Mélodie, é francesa. Eu acho que essa ideia de construção meio misturada aqui interessou à Alice, e aí quando ela me perguntou se estava tudo bem eu falar português no filme, óbvio que tá tudo certo, né? Eu fui entendendo que Alice não é uma pessoa que vai definindo as personagens tão de uma maneira muito óbvia ou fechada. Dá para ver que eu sou brasileira. Você sabe que eu sou brasileira porque você é falante da língua portuguesa e brasileiro ou mesmo. Mas você sabe que eu sou do Brasil por isso. No Festival de Cannes, por exemplo, algumas pessoas vinham me perguntar que língua eu falava se era espanhol.

Falando especificamente sobre isso das línguas… você já tem alguns trabalhos na carreira, mas acho justo dizer que sua carreira está no ainda no primeiro ato, e você já vai para um filme que não só é uma produção de outro país, diferente do que pode esperar uma produção brasileira, mas que trabalha justamente com essa mistura de línguas de nacionalidade.

Quando eu passei no teste foi que ela me disse que eu era protagonista junto com o Josh O’Connor, que eu já conhecia por The Crown, e é um ator muito bom de nossa geração, e a Isabella Rossellini, que é uma figura absolutamente importante, uma incrível, então eu entendi que tinha essa mistura.

Pensei muito em como ela ia fazer essa junção, porque não é só a língua, é um pouco de cultura também. O jeito. A maneira de abordar. Eu vejo diferença entre uma escola britânica de teatro, na formação de ator da escola italiana, de uma francesa, então ali eu acho que estava o interesse dela. E aí eu venho um pouco para contribuir com o que existe aqui, uma brasileira que fala um pouco de italiano, e que tem essa essa minha trajetória. Isso não é necessariamente difícil, é curioso e inclusive excitante, porque você está conhecendo novos mundos, mas exige exigiu de mim.

Na prática, você muda a preparação?

Isso muda bastante a relação com texto, com estudo. Eu tive que aprofundar mais os meus estudos no italiano. Havia muitas línguas sendo faladas no texto, outra língua na direção, então eu precisei estar mais presente, mais atenta. Não tinha um lugar pra relaxar, digamos. Eu tinha que estar sempre me esforçando e trabalhando, até que eu me vi fluindo melhor e entendendo melhor não só a língua, mas a Alice como diretora. Eu acho que é muito importante, quando eu entro num projeto, entender o diretor, o que ele deseja e como ele vê o filme para tentar contribuir mais e mais. Eu tive que entender um pouco a cabeça da Alice, o mundo da Alice, que não era geograficamente o meu. A gente filmou num lugar muito dela. Tinha até uma locação que é realmente vizinha da casa dela,

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Foi muito importante, tanto essa questão da raiz italiana do lugar dela, quanto a ideia do estrangeiro. Um protagonista é estrangeiro. A outra, eu, é também estrangeira. Então tem que ser impressa visão de lá, e de fora. Eu acho que a filmografia da Alice revela muito uma Itália muito nova por um realismo meio fantástico, por exemplo através dos Tombaroli [italiano para caçadores de tumba], os personagens que roubam os artefatos. Eles não são atores profissionais. Eles são dali mesmo.

A história da Itália, sua personagem, acontece muito em paralelo assim à história principal. Eu diria, na verdade, que ela é mais que uma coadjuvante. É quase como se fosse possível fazer o filme pela perspectiva dela. Quando você foi pegou o papel começou a trabalhar, o que que você achou que era o mais importante para acertar sobre a sua personagem?

O protagonista é o que puxa o filme. A narrativa. É o personagem do Josh O’Connor, Arthur, que é essa figura muito conectada ao passado, ao que está no subterrâneo, ao que tá meio morto, que está buscando um negócio que ele não sabe exatamente o que é. Então um protagonista mais sombrio. E eu acho que a Itália é um contraponto. Eu vejo a importância da Itália como uma luz, um pouco do presente e do futuro. É uma figura que não é tão melancólica como o Arthur. Ela não tá presa no passado, no que aconteceu com ela.

É interessante quando a Alice coloca esses dois filhos na vida da Itália, porque sugere um passado pra ela. Quem são os pais dessas crianças? São crianças muito diferentes, então, será que são dois pais diferentes? Ela tem uma vida e ela dá conta do presente, do que existe ali, agora. Então a minha construção foi a partir dessa outra perspectiva do roteiro.

Eu assisti outro filme com você recentemente: Malu, de Pedro Freire, no Festival de Sundance, que cobri virtualmente. Também é um filme muito bom. Suas personagens não se resumem a isso, mas eu acho que dá para dizer que uma característica muito importante da Itália que ela é mãe, e uma característica muito importante da Joana, sua personagem em Malu, é que ela é filha. Como é que foi passar de um papel pro outro?

Olha Guilherme, foi assim: Eu saí do La Chimera, cheguei no Brasil e imediatamente fui pro Rio de Janeiro gravar Malu. Então, eu tive que ser bem rapidinha nessa mudança. O Pedro é um diretor super interessado e muito bom, e muito competente como diretor de atores, então foi um projeto muito legal desde a preparação.

É muito louco, né? Porque Malu é um filme mais realista, até no sentido das referências do Pedro, por exemplo. Cassavetes é uma inspiração

A própria história é inspirada na vida dele.

Exatamente, eu faço um pouco ele no filme, né? E tem uma relação muito forte e densa com a Malu, a atriz interpretada pela Yara de Novaes. É engraçado, Guilherme, porque cada diretor tem uma temperatura e um desejo. Então com a Alice, não é que eu não era definida também como mãe, mas eu considero a Itália como uma personagem que podia cair num mundo cômico, mas também num drama mesmo. A gente pode olhar pela perspectiva da vida da Itália e ela está numa corda bamba, parece um pouquinho acima da realidade. Já com o Pedro, é ali, é real. Ele sabe até a data que as coisas aconteceram. São linguagens muito distintas.

Eu vou te dizer que assistir esses dois filmes com você em rápida sequência assim, nesses poucos meses, me deixa muito empolgado com você como atriz assim brasileira. Acho que a gente tem muita razão para estar empolgado com o que você está fazendo, e essa é uma pergunta um pouco geral, mas eu queria aproveitar a conversa. Como é que você vê, hoje, o seu momento como atriz?

Olha Guilherme eu fico feliz com essa sua perspectiva porque eu também estou feliz. Eu acho que não podia ser melhor. Dois filmes longas que eu fiz, um foi para o Festival de Cannes e outro pra Sundance. São festivais muito importantes. Mas não só pelo festival em si, mas porque eu acho que eu trabalhei com diretores muito interessantes, que fazem cinema com um C maiúsculo. O Karïm, a gente já conhece muito, e acho que esse ano ele está com outro filme em Cannes né?

Sim, Motel Destino.

Ano passado eu e o Karïm estávamos na mostra competitiva, a gente voltou cada um com um filme estrangeiro. Ele com um filme britânico, Firebrand, e eu com um italiano. É muito honra, pra mim. São diretores com quem eu nunca imaginei que poderia trabalhar assim, logo no início. Até fizeram uma pergunta hoje, como é que eu escolho os projetos, e eu acho curioso pensar isso porque nos dois filmes, em La Chimera e Vida Invisível, eu fiz testes, na verdade. Os projetos nos escolhem. Eu não sabia nada dos roteiros. Quando fazemos testes, normalmente não sabemos o que é o filme. A gente só pega uma ceninha e faz a ceninha, um monólogo que nem é do filme. Eu tive sorte, até aqui, com esses projetos que tem uma qualidade muito grande e eu tô muito feliz assim. Eu acho que eu nunca estive tão feliz quanto nesses últimos anos

La Chimera está em cartaz no Brasil.

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