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Crítica

X-Men - Primeira Classe | Crítica

Aceitação dentro e fora da tela

02.06.2011, às 18H10.
Atualizada em 02.11.2016, ÀS 08H07

A chamada "Era de Ouro dos Quadrinhos" começou em 1938, com o lançamento de Action Comics 1, revista em que estreou o Superman, o primeiro dos heróis superpoderosos. Nessa época as histórias em quadrinhos eram mais sisudas, combinando com o ânimo sombrio de seu tempo, quando Superman e Capitão América tinham como grandes inimigos as forças do Eixo. Na década seguinte, com o otimismo dos tempos do pós-guerra, acompanhando as tendências e a empolgação tecnológica, as HQs de heróis tornaram-se mais fantasiosas e coloridas. Sai Adolf Hitler, entra Lex Luthor.

Nas décadas seguintes, a DC Comics manteve esse distanciamento da realidade, oferecendo aventuras cósmicas e heróis superpoderosos como poucos. No início da década de 1960, porém, veio a "Nova Onda" dos quadrinhos, o inevitável rompimento com o estabelecido, comum a todas formas de arte. Surgiam as criações de Stan Lee, Jack Kirby e Steve Ditko, o triunvirato sagrado da Marvel Comics. Nesse novo universo, os heróis - ainda que continuassem coloridos e divertidos - viviam em cidades que existiam no mundo real e tinham problemas mais próximos dos nossos. Do atormentado Coisa ao fracassado Peter Parker, os heróis da casa sofriam na pele (rochosa ou não) agruras cotidianas enquanto enfrentavam hostes de malfeitores.

X-Men - Primeira Classe

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Foi nesse momento histórico que surgiram os X-Men, heróis temidos e odiados pela mesma humanidade que juraram defender. A raça mutante de que fazem parte viveu desde o início uma cisão de ideias, representada pelos antagonistas Charles Xavier, o telepata mais poderoso do mundo, e Magneto, o mestre do magnetismo (inspirados livremente nos debates ideológicos da época de Martin Luther King e Malcolm X pelos direitos dos negros). Enquanto Xavier acreditava na convivência pacífica entre humanos e mutantes, o terrorista tinha a certeza da supremacia de sua raça, considerada o próximo degrau na evolução da espécie, e desejava escravizar o homo sapiens. O primeiro encontro deles durou apenas exatos dois quadrinhos da terceira edição das revista, mas deixou um legado que cruzou os 50 anos seguintes.

A questão central dos mutantes tornou-se a aceitação. A da sociedade e também a dos mutantes por si próprios. É esse também o tema central de X-Men - Primeira Classe (X-Men - First Class, 2011), filme que reinicia a franquia dos personagens no cinema tendo como pano de fundo justamente a década de 1960.

O debate, claro, já existia nos primeiros filmes da série, o que faz sentido se considerarmos que o principal responsável pela adaptação desse universo ao cinema, Bryan Singer, está de volta a bordo. Mas nunca tão focado quanto agora.

Ao lado de Singer estão Ashley Miller, Zack Stentz, Jane Goldman e o diretor e corroteirista Matthew Vaughn (Kick-Ass). Tantos nomes assinando um só roteiro geralmente é sinônimo de um texto que não sabe para onde ir. Não é o caso aqui. O novo X-Men não apenas é um filme divertidíssimo de verão, cheio de ação, humor e aventura, mas também um drama sério nos momentos certos. Especialmente em relação aos personagens, cujo desenvolvimento vai diretamente ao encontro do debate central dos mutantes.

A utilização da personagem Mística (Jennifer Lawrence, em atuação que cresce com o decorrer do filme) é determinante nesse sentido. Transmorfa, a garota tem uma aparência real hedionda - escamosa, com olhos amarelos. Dada a natureza de seu poder - transformar-se em outra pessoa -, porém, ela consegue esconder-se o tempo todo. Mas como alcançar seu potencial se você vive sua vida concentrando-se em ser alguém que não é? A questão - de rara profundidade em um filmão de grande orçamento - também atinge outros personagens, quase todos excepcionalmente bem trabalhados e desenvolvidos.

É inspiradora a maneira como o filme não trata o assunto como mera desculpa para demonstrações de poder e embates entre os mutantes bonzinhos e os malvados. Prepare-se, assim, para adorar o personagem que nos quadrinhos é o maior terrorista do Universo Marvel: Erik Lehnsher, o Magneto. Michael Fassbender, que já havia mostrado a que veio em Bastardos Inglórios e Hunger, aqui tem sua chance de tornar-se um astro de primeiro escalão - e a agarra sem receios. No início uma espécie de James Bond magnético, ele precisa lidar com outro tipo de aceitação, a de seu passado. Erik não é mau, é apenas focado em seu ódio, algo com o qual podemos nos relacionar desde a cena de abertura. Como não odiar o nazista que matou sua família e desejar caçá-lo ao redor do planeta? Graças à qualidade do trabalho de Fassbender, uma obsessão doentia nunca pareceu tão bacana.

Magneto não estaria completo sem seu nêmesis (razão pela qual o alardeado filme-solo do mutante talvez não funcionasse) - e James McAvoy tem um desempenho igualmente brilhante como Charles Xavier, o Professor X. O roteiro e a atuação do escocês simplesmente transformam um dos personagens mais patriarcais e sérios dos quadrinhos em alguém muito diferente. É como se você pudesse conhecer seu pai antes de ele casar com sua mãe. Além das qualidades professorais, Charles é engraçado, charmoso, bon vivant e cheio de entusiasmo e otimismo. É também repleto de falhas, todas essenciais para o funcionamento do tema. As raízes do "bem" e do "mal" em X-Men - Primeira Classe, portanto, são emaranhadas em um solo fértil de situações inteligentes. É muito mais interessante o debate quando ambos os lados argumentam com razão e, ainda que antagônicos, pareçam igualmente corretos aos olhos do observador.

Todos os momentos em que McAvoy e Fassbender dividem a tela já valeriam a produção, mas entra em cena o terceiro vértice do triângulo, o de Sebastian Shaw de Kevin Bacon - e o filme só melhora. O vilão, cercado de excentricidades dignas dos personagens que davam trabalho a James Bond antes dos tempos de Daniel Craig, traz o elemento indispensável a qualquer filme de quadrinhos que se preze. O líder do misterioso Clube do Inferno tem os mutantes mais glamurosos, um submarino tunado e, claro, um plano maligno mirabolante - devidamente explicadinho e com direito ao "power point" de época. Depois de tantos debates e questões filosóficas, um bandido sacana e playboy pra surrar durante um clímax explosivo nunca é demais.

Com o foco em Xavier, Magneto e Mística, é surpreendente que ainda sobre tempo para explorar outros personagens secundários, mas o roteiro dá o que fazer a quase todos. Emma Frost (January Jones) tem espaço de sobra como a ajudante exótica de Shaw (que também conta com os meramente alegóricos Azazel e Maré Selvagem, cujas presenças se justificam exclusivamente pela ação e o visual). Mas quem conhece a personagem de Jones dos quadrinhos não deve gostar do resultado. A Rainha Branca sempre foi manipuladora, inteligente e extremamente sedutora nas HQs. Aqui, a atriz se restringe a repetir sua cara de blasé de Mad Men, um dos únicos pontos fracos da cultuada série.

Já a dinâmica da "primeira classe" - formada por Destrutor (Lucas Till), Fera (Nicholas Hoult), Banshee (Caleb Landry Jones), Darwin (Edi Gathegi) e Angel (Zoe Kravitz) - dá o tom do humor que o filme precisa para se estabelecer também como entretenimento descontraído e ao mesmo tempo buscar o público mais novo. Algo que fica claro na cena em que eles se reúnem pela primeira vez e, como jovens que são, começam a se mostrar. Os poderes que eles demonstram ali - e em uma das cenas seguintes, com o ataque do Clube do Inferno - são fundamentais para o competentíssimo clímax. Nele, Vaughn consegue lidar com vários focos de ação ao mesmo tempo: um combate aéreo, outro de intensa fisicalidade, a tensão da Crise dos Mísseis de Cuba e o confronto principal, que culmina em uma ótima cena, a da moeda acompanhada pela câmera, cujo movimento reflete também a irreversível cisão de valores dos personagens principais.

Nas ideias, na diversão e no design, X-Men - Primeira Classe resgata conceitos do passado dos quadrinhos ao cinema de super-heróis. É como se, pela primeira vez, todas as "Eras" da Nona Arte e suas adaptações conseguissem dialogar no cinema. Há os uniformes bregas e coloridos, a pancadaria pirotécnica, o vilão maluco e os poderes estilosos... mas há também a sobriedade de temas, a qualidade dos personagens e o drama. Em X-Men - Primeira Classe a aceitação não se restringe aos mutantes, mas também aos próprios "comic books" sabendo trabalhar seu lado mais "comic"... dentro e fora da tela.

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Nota do Crítico
Excelente!

X-Men - Primeira Classe

X-Men: First Class

Ano: 2011

Lançamento: 03.06.2011

Gênero: Ação

País: EUA

Classificação: 12 anos

Duração: 132 min

Direção: Matthew Vaughn

Roteiro: Ashley Edward Miller, Zack Stentz, Jane Goldman, Matthew Vaughn

Elenco: James McAvoy , Michael Fassbender , Rose Byrne , January Jones , Jennifer Lawrence , Kevin Bacon , Oliver Platt , Zoë Kravitz , Álex González , Jason Flemyng , Nicholas Hoult , Morgan Lily , Beth Goddard , Bill Milner , Laurence Belcher , Caleb Landry Jones , Edi Gathegi , Lucas Till , Demetri Goritsas , Glenn Morshower , Don Creech , Matt Craven , James Remar , Ray Wise , Brendan Fehr , Michael Ironside , Hugh Jackman , Rebecca Romijn

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